11/8/2016 - Campinas - SP
Em defesa da língua portuguesa, por Jorge Bento, Universidade do Porto
da assessoria de imprensa
Hesitei muito quanto ao título a atribuir a este posicionamento. Estive tentado a intitulá-lo “Contra a capitulação face ao imperialismo do inglês”. Tive e tenho a consciência, viva e acordada, de que não poucos leitores se sentiriam atingidos e feridos com aquela formulação; enquanto alguns, quiçá em menor número, bateriam palmas de satisfação. O que revela bem a extensão do problema, bem como o grau de habituação e de reação à patologia em causa.
Como quer que seja, mesmo tendo prescindido do título inicialmente imaginado, não me afasto um milímetro da tentativa de exposição do sentido que ele encerra. É minha obrigação agir assim, quer em nome da pertença ao espaço linguístico do português, quer para dar voz a convicções de ordem académica e cívica.
1. Entendo que a Universidade pode e deve constituir um palco de celebração do nosso idioma e da sua promoção no cenário internacional. Nada me move contra o inglês ou contra outras línguas; de modo algum, proponho que a Universidade lhes vire as costas. A nossa língua (e cultura) não se fecha sobre si mesma, não advoga o isolamento e a exclusão; antes é aberta à incorporação do diferente e do estranho. Do mesmo modo deve agir a Universidade.
Até aqui, tudo bem. Os entendimentos e as conjugações de fins, interesses e vontades parecem ser fáceis de conseguir. O mais difícil e inquietante sucede, sempre, quando os princípios são trocados por conveniências e modas conjunturais, ditadas pelo senso comum e aceites por quem não quer ficar excluído das listas de premiados pela adesão ao oportunismo abjeto e ao provincianismo bacoco.
2. Sejamos assertivos e digamos sem delongas ou rodeios: a desvalorização da língua portuguesa na Universidade configura uma aberração absolutamente inaceitável. Não apenas é desvalorizada a publicação em português de livros, ensaios, estudos e de escritos equivalentes aos endeusados papers; também é escamoteado o facto de o nosso idioma ser uma das línguas com maior presença no panorama comunicativo mundial, e de, por via disso, possuir uma enorme valia económica. Mais ainda, a Universidade descarta, pura e simplesmente, o indeclinável empreendimento de defesa, exaltação e preservação da língua portuguesa, bem como a tarefa de contribuir para a sua admiração, mestria e respeitabilidade.
Muito a propósito, o Professor Jorge Miranda, ilustre constitucionalista, coloca o respeito pela língua portuguesa entre as prerrogativas fundamentais, vertidas no texto da Constituição da República Portuguesa. Nesta conformidade, questiona se serão “cumpridas as obrigações constitucionais e respeitado o direito à identidade linguística dos cidadãos portugueses”, quando, entre outras coisas, “se admitem primeiras denominações de escolas universitárias em língua estrangeira”, “se impõe outra língua a alunos portugueses (…) em aulas ministradas por professores portugueses em escolas universitárias portuguesas”, “não se incentivam os alunos do programa Erasmus a aprender português, quando este programa, pelo contrário, visa a interculturalidade e não a uniformização linguística”. E conclui com estoutra bordoada: “Apenas um provincianismo antipatriótico e uma prática de subserviência pode explicar estes e outros factos, esquecendo-se que a língua é quase o único domínio de independência que hoje nos resta, que é língua oficial de mais sete Estados e que é falada por mais de 200 milhões de pessoas em todos os continentes.”[1]
Este dado referente ao número de falantes no presente peca por escasso, tendo em vista a reflexão plasmada nestas linhas. Com efeito, o português é uma das poucas línguas que se encontram em expansão, quer no tocante aos seus falantes naturais, quer no respeitante aos interessados e envolvidos na sua aprendizagem. Estima-se que, num horizonte temporal não longínquo, seja falado por cerca de 350-400 milhões de pessoas. Ou seja, o português não é, como o francês, por exemplo, uma língua em declínio; é, antes, uma língua em franca ascensão, merecedora de um crescendo de aprendizes em países assaz diversos, nomeadamente a China.
3. Obviamente, este panegírico da língua portuguesa não pode ser confundido com o absurdo de que somente ela seja falada ou escrita dentro da Universidade. Qualquer cidadão colhe enormes vantagens da sua proficiência em vários idiomas. Creio que isto é tão evidente que não necessita de desfiar um rosário de justificações.
Mal seria que um docente universitário não possuísse aptidão e competência noutros idiomas; a Universidade, em vez de janela de abertura e contemplação do mundo, daria de si a péssima imagem de alheamento, clausura e encerramento em relação ao contexto universal. O contacto com os pares seria limitado, e impossibilitado o acesso às fontes originais de tantos tratados de ciência, cultura e sabedoria. Claramente, esta atitude de miopia não estaria à altura do que se espera da instituição universitária, da medida de cumprimento da sua missão e de assunção da sua responsabilidade cultural, humanista e social.
Outra coisa bem diferente é a proposta estapafúrdia, que passa pela cabeça de muita gente pretensamente douta e iluminada, de lecionação unicamente em inglês e de acabar com aulas em português. Será esta uma acusação exagerada ou mentirosa? Não, não é! De resto, em muitos inquéritos, é perguntado o número de disciplinas lecionadas em inglês. Esta “inovação” (mais uma do extenso cardápio que o frenesi convulsivo,managerialista e reformista trouxe, na última década, à mesa da ordem do dia) conta tanto para melhoria das avaliações e dos rankings que algumas instituições vão ao cúmulo de propagandear, urbi et orbi, o despautério de decretar morte ao português e de somente oferecer cursos em inglês!
Acresce que, não raras vezes, as dissertações de doutoramento, além de escritas em inglês, são também defendidas nesta língua em provas públicas, sem a participação de qualquer elemento estrangeiro no respetivo júri! Pasme-se, mas é a pura e ridícula verdade, que encontra uma putativa (que vocábulo tão esquisito!) razão no facto de, deste jeito, a dissertação ficar pronta para ser desmanchada e publicada sob a forma depapers.
Como corolário deste ponto, afirmamos inequivocamente o seguinte: os cursos, em universidades portuguesas, devem ser exclusivamente lecionados no nosso idioma. É curial disponibilizar aos estudantes estrangeiros programas de aprendizagem prévia do português. Sob pretexto algum, pode haver capitulação nesta matéria; caso contrário, cairemos na prática da traição. Ora, como “Roma não paga a traidores”, não teremos nada a ganhar com ela. Na captação de estudantes oriundos de outras paragens, nós não estamos em competição com universidades inglesas ou de língua inglesa; os candidatos a ingressar nas nossas instituições são atraídos para elas por outras razões, estranhas à questão da língua.
4. A língua portuguesa dispõe de uma riqueza extraordinária e incomparável no plano concetual, lógico, metafórico e semântico. Dominá-la com propriedade sólida e como instrumento fiador de elevação intelectual e espiritual, eis uma competência que devia estar ao alcance de muitos. Porém, são poucos e cada vez menos os universitários que fazem parte de tal universo.
A consequência verdadeiramente trágica desta desdourada e indigna realidade advém do seguinte: entre a linguagem (escrita ou oral) e o pensamento há uma relação de intimidade e reciprocidade, que associa a forma e o conteúdo. A linguagem representa a forma, o nível, a densidade, o fulgor e a luminosidade das ideias – ou a sua penúria, fragilidade e ausência. As palavras revelam a performance mental, a arquitetura, o conteúdo, a ordem e o rendimento do pensamento que as anima. Uma linguagem débil, enfraquecida, com trancos e barrancos, sem clareza e esplendor traduz um estado igual do pensamento e raciocínio. A confusão e pobreza da linguagem deixam à mostra o estado performativo do pensamento. Mais, o labor de aprimoramento da linguagem e, ao invés, o descaso linguístico repercutem-se no pensamento; o nível das palavras “por fora”expõe o primor do intelecto, da cognição e racionalidade “por dentro”.
Karl Kraus (1874-1936), escritor e poeta austríaco, é perentório: “A linguagem é a mãe, não a criada do pensamento.”
Deixemo-nos de paninhos quentes e salamaleques: quem não sabe escrever e falar conforme à norma culta e erudita, também não logra pensar conforme aos requisitos próprios do desempenho em sede universitária. Esta maleita é notória e propaga-se, ameaçando contaminar, de uma ponta à outra, a tapeçaria académica.
A linguagem dá-nos o leite da integração no mundo: os valores, princípios, sonhos, ideais e inclinações; os modos de perguntar e responder, de observar e entender, de aperceber e valorar, de ser e estar.
Ludwig Wittgenstein (1889-1951) formulou assim: “Os limites da nossa linguagem são os limites do nosso mundo.” E o pensador espanhol Fernando Savater complementou: “A linguagem é o tapete mágico e simbólico deste permanente sobrevoar ativamente a realidade para tentar chegar a ser plenamente real. Sem nunca o conseguir totalmente, claro…”
Portanto, quando advogamos a defesa e o cultivo esmerado da língua portuguesa na Universidade e pelos respetivos docentes, não somos impulsionados por uma causa de segunda ordem ou por conveniências e motivações pessoais. Estamos a pugnar pela renovação do legado matricial e central da Universidade: a incumbência de ser casa da espiritualidade e intelectualidade, da sabedoria e da erudição.
Não se subestime este pressuposto: um doutor é um profissional da palavra e do ministério de a escrever e dizer com estilo erudito, esbelto e perfumado, claro e sublime, ético e estético, atraente e quente, e não feia e repelente. Deve, pois, ser formado como cultor do uso maior e do poder e esplendor da palavra. A lógica científica, epistemológica e filosófica pede a companhia condizente e colaborante de um convincente nível retórico.
5. Como é que se chegou ao abandono e à desconsideração da língua portuguesa na Universidade? É possível inventariar e enunciar várias causas para esta involução. Queremos aqui referir algumas, com origem, batismo e consagração no ambiente universitário e no entorno condicionante, que contribuem manifestamente para o estulto e deprimente estado vegetativo do português.
A muitos docentes universitários agrada mais escrever papers em inglês do que livros em português. As “razões” prendem-se umas às outras.
A primeira, imediata e simples, ressalta à vista desarmada: os papers são mais valorizados na avaliação curricular de candidaturas a concursos da carreira académica ou de projetos patrocinados pelas agências de financiamento. Acrescente-se, como espada de Dâmocles, a obrigatoriedade do “publish or perish”. Sim, em inglês, porque em inglês nos vangloriamos e vendemos, e cometemos a vergonha de trair. A cedência ao imperialismo do inglês rende dividendos e é um emblema lustroso na lapela do casaco da pesporrência e vaidade, mesmo que salpicado pela lama da indignidade!
A segunda “razão” é contígua à primeira: para avaliar papers o critério utilizado liga-se, sobretudo, à quantidade. Para aumentar esta, basta colocar o nome em textos escritos, a maior parte das vezes, por outros, sejam eles orientandos e estudantes de pós-graduação, sejam colegas de categoria inferior na hierarquia académica. Quanto aos livros, eles são avaliados pela qualidade, e têm que ser escritos pelos seus autores, o que custa um trabalho danado (se seguir o mandamento do português escorreito) e acarreta o julgamento de um público vasto e sedento de descobrir a relevância dos assuntos versados.
A terceira “razão” é indissociável da proficiência linguística. Para publicar papers não é necessário um amplo e superior domínio do inglês; basta conhecer um vocabulário reduzido e simplificado, que dá pelo nome de “globish” e permite comunicar de forma rudimentar, à escala global.
Por conseguinte, a defesa do português não tem implícita somente uma revolta contra o “imperialismo do inglês”; contém fundamentalmente uma recusa da superficialidade do“globish”, porquanto ela atenta contra o conceito fundador da Universidade e contra a idiossincrasia e identidade de um lídimo professor universitário.
O abastardamento da linguagem, hoje em curso na Universidade, expressa e induz o abastardamento da profissão de docente, do ensino e de outras dimensões axiais da missão universitária. A queda na absurdidade e o incaracterístico coabitam com cama feita, mesa posta e roupa lavada, casados em comunhão de bens.
Tomo emprestado de Vasco Pulido Valente este desabafo dorido e tingido de saudade: “O empobrecimento da língua (não só devido à minha idade) custa. (…) Sei muito bem, e tristemente, que a cultura das letras começa a desaparecer e está, a muito curto prazo, condenada. Mas não deixo de lamentar que o prazer de uma frase, de um parágrafo ou de uma vírgula maléfica se percam para sempre.”
Enfim, no recinto universitário ressoa nitidamente o toque de finados do belo ofício magistralmente descrito por Gilberto Freyre (1900-1987): “Escrevendo, venho vivendo uma arte misturada a uma ciência (...) Uso as palavras intuitivas sem repelir as lógicas, as cotidianas sem repudiar as raras, as populares sem deformar as eruditas, as sensíveis sem repelir de todo as abstractas.”
6. Estamos encerrados num ardiloso, bafiento, complexo e perigoso labirinto. Muitos apreciam-no e louvam-no, gastando nisso as suas vidas e depreciando e infernizando as dos que seguem outra via.
É claro que podemos sair de semelhante labirinto, o que requer uma lúcida mudança de paradigma. O primeiro passo seria reconhecer que nos meteram no labirinto, que estamos encalhados nele e no modelo de sociedade e de universidade que ele reflete. Somente sairemos do aprisionamento e encurralamento, se tivermos a coragem de declarar o modelo gasto, e de encarar a busca urgente de ideias e perspectivas de superação, que abram caminhos novos.
Este é um combate que nós, cidadãos e académicos universais e universalistas (e não apenas lusófonos), somos chamados a travar contra “os dislates inquisitoriais da irracionalidade globalizadora e de vocação imperial instalada como garrote na garganta da humanidade - como é tragicamente evidente no nosso caso.”
Quem assume esta postura é o Professor Manuel Patrício, incondicional apoiante da obrigatoriedade de sobressaltar “a consciência dos que persistem na fidelidade à liberdade e multiplicidade de expressão linguística na paleta que vem sendo construída criadoramente ao longo dos milénios por todas as comunidades humanas e para a qual a língua portuguesa tem notavelmente contribuído.” Congrega-nos uma visão de ampla e suprema importância: “o anglofilismo (…) é um particularismo cultural e epistemológico; o universalismo imperial (do inglês) não é um universalismo real; a defesa das línguas nacionais historicamente desenvolvidas na prática institucional universitária não é uma forma de nacionalismo académico e científico; à universalidade científica chega-se, pela natureza das coisas, a partir do concreto de uma situação, da qual a língua da comunidade é a alma.”
Figura cimeira da laboração filosófica acerca da educação, o insigne Mestre está confiante na nobreza do desafio e no venturoso desenlace, “por dura e longa que seja a luta. É o cerne do destino humano que está em causa e em jogo. Tudo o que fizermos pela língua portuguesa se inscreve nesse jogo.”
Acordemos e clamemos por renovação! A desdita do presente reza e suplica por urgente substituição. A esperança de renovaçãoestá fechada, a sete chaves, na arca bolorenta da“papermania” em inglês, aí definhando e apodrecendo, se o sobressalto do desassossego não abalar os espíritos inquietos pelo aguilhão da “parésia”
A melhoria da formação prodigalizada na Universidade deve assentar no reforço de qualificação do português como língua de ensino, de investigação e publicação, de administração e gestão, mesmo que isso implique a perda de pontos nos tresloucadosrankings, tão louvaminhados pelos reverenciadores dos oligopólios que comandam o mercado das revistas científicas.
Ensinemos e publiquemos em português, sempre que possível e conveniente! Esta proclamação não exclui as publicações em inglês, nem, muito menos, convida a lançar um anátema sobre elas, como ocorre atualmente com a produção em português. Todavia, conclama para a tomada de consciência de que a Universidade e cada um dos seus docentes incorrem num gravoso ilícito, ao eximir-se de avocar a sua quota-parte na política estratégica e patriótica de afirmação coerente e consequente da língua portuguesa, como vetor da soberania e da integridade nacional. A isso pertence o imperativo de não nos vergarmos servilmente ao imperialismo do inglês que, ostensiva ou melifluamente, se entranhou no vocabulário da Universidade, de cima a baixo, usando anglicismos para tudo e para nada.
“Minha Pátria é a língua portuguesa”, exclamou o desassossegado Bernardo Soares. Urge acorrer aos seus gritos de socorro e libertá-la das camisas, dos coletes e espartilhos que lhe são impostos no hospício universitário,com a atitude ínsita na seguinte anotação, atribuída a Fernando Pessoa: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, (…), e esquecer os caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos.”
Jorge Miranda, Outro direito fundamental em risco: o direito à língua, jornal Público, 09.02.2013.
Recentemente António José Amélia, Vice-Presidente da Assembleia da República de Moçambique, fez a apologia da promoção da língua portuguesa, expressando o “sentimento de orgulho e emoção” pelo património que ela encerra e é ponte da “amizade fraternal” com os Países de Língua Oficial Portuguesa. Mais, sublinhou a necessidade de não descurar importância à língua portuguesa no espaço digital, sob pena de “ofuscar cerca de 300 milhões de cidadãos do mundo falantes desta língua”. (Jornal Notícias, p. 7, 27 de Junho de 2016, Maputo).
“A norma culta, a dominante, a que é ensinada como correta, (….) é necessária para preservar e aprimorar a precisão da linguagem científica e filosófica, para refinar a linguagem emocional e descritiva, para conservar a índole da língua, sua identidade e, consequentemente, sua originalidade. Ao contrário do que entendi de certas opiniões que li sobre o assunto, a norma culta não tem nada de elitista, é ou devia ser patrimônio e orgulho comuns a todos. Elitismo é deixá-la ao alcance de poucos, como tem sido nossa política.” (João Ubaldo Ribeiro, Observações de um usuário, O Estado de S. Paulo, 29 de maio de 2011)
Surgem neste texto várias citações, cuja origem não consigo precisar. Elas fazem parte de um ficheiro, onde as arquivei, sem ter registado a fonte. Eis um desleixo, que assumo e do qual me penitencio.
Comparada com as exigências contidas nestas formulações, os horizontes abertos e os voos permitidos pela linguagem corrente na Universidade são assaz estreitos e rasteiros.
“Só quem está em estado de palavra pode enxergar as coisas sem feitio”, afirmou Manoel de Barros (1916-2014), poeta do Pantanal brasileiro.
Vasco Pulido Valente, Voltar a casa, Jornal Público, 06.09.2009.
Museu da Língua Portuguesa, São Paulo.
Excertos de uma mensagem enviada por email, datado de 25.05.2016.
“Parésia”: Coragem da verdade. Considerada pelos filósofos pré-socráticos e por Sócrates (469 ou 470-399 a. C.) a mais excelsa das virtudes, expressa-se no dom de adotar e proclamar posições fundadas na experiência crítica da história, da realidade e da vida. Imanente ao espírito livre, a coragem da verdade, de a procurar, afirmar e defender, devia ser a atitude comum e sentir-se particularmente em casa na Universidade. Porém, é escorraçada de toda a parte, como se fosse um cão tinhoso, o que ilustra bem o presente estádio de decadência civilizacional. Não sei onde vamos parar. Sei, mas não me conformo, o tipo de ser humano que estamos a fabricar: foge da “parésia” como o Diabo da cruz.